sexta-feira, 29 de julho de 2016

Laci Osório: a história como sustentação da poesia








Virgínia do Rosário




            É da história que Laci Osório  extrai o material de seu trabalho, enquanto poeta. Na elaboração de sua poesia, resguardando as características da arte literária, Laci Osório dirige seus instrumentos de modo que seu produto exponha seu compromisso de classe e proponha o possível e o provável: um mundo livre da exploração do ser humano pelo ser humano.
            Assim é que a poesia de Laci Osório, ao sustentar-se na história, ao comprometer-se com o coletivo, ao endereçar-se à transformação social, reivindica a valorização do trabalho humano. Por isso, comparecem à poesia de Laci, por exemplo, os operários das usinas de carvão, as lavadeiras e os barqueiros que, no poema Guaíba, como o rio, “artéria de sangue sujo”, recebem a denúncia do poeta pela exploração sofrida; ou o camponês que “faz química de suor e sangue/transforma arroz em moeda” para as férias da burguesia rural, na Europa, como no poema À luz dos cassinos; ou o trabalhador do saladeiro que com “pés escamados de sal” prepara o “boi banquete/a todos ricos da espécie/ E na fumaça o arrabalde/ comendo _ em síntese os ossos”, como no poema Saladeiro em tempo de poema.
            Quer cantando os rios Guaíba ou Ibirapuitã (como nos poemas Guaíba ou O rio, quer cantando a música (como em A gaita em variações, Ode ao piano ou Violinos de Paganini, Laci canta, antes, o trabalho humano na história.
            Nos poemas Esperança, A fábula da torre e São Miguel das Missões, o poeta enfoca fatos históricos para denunciar a opressão de que são vítimas os que, com seu trabalho, vêm fazendo, efetivamente, a história, do mesmo modo que apresenta, por exemplo, nos poemas Isadora Duncan e Nasceu uma rosa no mapa da América, a vitória coletiva do trabalho conferida na organização de uma nova sociedade. Destacamos, a título de ilustração, de Lago de sol:
                        “Ritmos de fábrica _ as sirenes soam
                        e a Internacional orquestra as ruas
                        bandeiras de luz acendem consciências
                        _Um lago de sol soa no mundo
                        o apito rouco do Couraçado Aurora
                        que rasgou os mares _ ancorou no pão”.

            Cabe ressaltar também que a grande maioria das poesias de Laci, além de portar, no bojo da sua sustentação histórica, a valorização do trabalho _ e até por isso _, traz um reconhecimento especial à mulher e à criança: uma e outra criando e recriando e recreando a vida, pois que Laci une o trabalho ao ludismo e ao prazer neste tempo histórico que prevê e para o qual podem servir de exemplo versos do Poema dos jovens:
                        “E
                        seremos letras que cantam
                        pela boca das chaminés
                        no som de nossos passos
                        a cor de nossas roupas
                        a música dançando em nossos nervos
                        e o órgão das ruas tocando manhãs.”
            Vale frisar, ainda, que, da mesma maneira como reconhece em seus poemas, entre outros, poetas como Lorca, Maiakovski, Guillen e José Marti, Laci identifica que, por ser trabalho, a arte extrapola fronteiras, torna-se universal e, nesta universalidade, para o tempo histórico anunciado, a paz, junto à presença permanente da criança na poesia, ganha importância capital. Observe-se isto nestes versos de Violinos de Paganini:
                        “Sobre ondas de violinos
                        gostaria de cantar
                        sentir cirandas
                                  cirandas
                        pelas crianças do mundo
                        nas melodias da paz.”
            Com seu trabalho, ao sustentar-se na história, ao fazer arte, Laci, como quer Lukács, mantém-se fiel ao seu compromisso porque reconhece “constantemente o efeito extraordinariamente profundo e vasto da literatura sobre a consciência dos homens”. l




l. LUKÁCS, George. Marx e Engels como historiadores da Literatura. Porto, Nova Crítica,        1979, p. 93

2 comentários:

  1. Muito legal conhecer e descobrir um pouco esse poeta brasileiro e gaucho alegretense, poeta Virginia do Rosario.

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  2. Laci, uma referência da juventude de sessenta que tinha ideais revolucionários.
    Preservo na Biblioteca Comunitária do Canella o livro Música e Semente com uma fraternal dedicatória.
    Obrigado, Virgínia pelo excelente texto.

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